domingo, 28 de novembro de 2010

O trigésimo dia

Consulto a caixinha do correio, ela persiste convicta em manter-se vazia. Não poucas vezes, inunda-me a impressão de que a vida é uma festa para a qual não me enviou o convite. 
Que audácia, a dela!
Só que, por existir uma reserva de quarto para a meninice na alma, pulo o muro dos fundos e lá estou de penetra no evento. Faço-me auto convidada. O ambiente parece envolto pela inércia do excelente estado. A artilharia da oposição se mascara. E o desenrolar dos fatos acontece, como é de se supor.
Exponho-me em sinceridade. A infante grita do seu leito. Por ouvi-la em bom timbre, também ponho crédito na genuinidade de outrem. Resultado: a paradoxal sensação de contentamento e aflição no trigésimo dia. Anseio por recidiva, clareza de que há ressalvas.
Com os joelhos ainda ralados e as mãos sujas com a poeira do chão, não me reconheço uma atacante inata. A injúria não é meu objetivo. O único argumento que utilizo é a armadura desajustada. Aliás, careço também da conduta auto-explicativa. E deixo espalhado em outdoors o apreço por ele, só não vê quem não quer. 
Sussurro para aquela que grita dentro de mim: “abranda-te lá no âmago, menina, com o estado de sítio que vigora!” 
    Refugio das artilharias estrangeiras, ajusto minha armadura de proteção e me alojo em trincheiras emocionais. Explorem todo o campo da superfície - o da superficialidade -, soldados, exceto o meu terreno escavado. Reconheço-me, por enquanto, abstêmia radical e não lhes dou a alternativa para mais estragos.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Desventura sob negligência

          Falta-me, por hora, o discernimento das coisas. As traduzo por ideias próprias, intenções alheias e propósitos de ambos. Irmã das coisas fugidias é minha atual convicção de parentesco. 
     Andei de mãos dadas com a prudência, e quando a soltei de vez e abracei a certeza de ser permissiva,  me reconheci transeunte de estradas bloqueadas. 
     Lia-se na placa: "Proibida a passagem dos exaustos. Deixaste ao longo do caminho tua essência, a serenidade do íntimo e os passos sedentos. Perdeste neste novo itinerário. Andes, vás! Dês um passo atrás, para que possas talvez dar dois, três, ou até quatro à frente."
     E fui empurrada. Troquei os passos. Cambaleei no caminho de volta. Realizei que àquela imposição não caberiam parcerias. Aceitei. Não de bom agrado. Com péssimo agrado.E ,à contra-gosto, regressei naquela estrada.Com os pés descalços, as feridas se abriram. Não vou mentir, ainda doem. Mas doem sem a perspectiva da ira, tenha essa certeza.
     Reincorporei um pouco do que sempre coube a mim. Sublimei os maus presságios. Busquei paliativos.
     E se, à priori, demonstrei revolta, não pense que seja por  você ter mudado de ideia com tal rapidez, perdido a vontade ou enjoado mesmo. Metamorfose é característica inerente ao ser humano. É fato e não o contesto, admiro até. Mas tem que fazer-se metamorfosear sem ser leviano. Cativas e o é responsável por isto. Deve-se procurar sinestesia no discurso: ter tato ao verbalizar. Embora eu saiba que não o fez por má fé.
     E eu, que mal entendo de sinestesia, só quis oferecer o melhor. Dentro das minhas condições, já desgastadas, mas o tentei. E decepcionei comigo mesma, quando descobri o infortúnio da tentativa.
     Desejei a felicidade conjunta. Se foi preciso reparti-la, não quererei ficar sozinha com este bem. A compartilho e, com a  permissão, instigarei sua mitose para ambos. Se no proveito tropeçar, Duas Mãos é meu nome.